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Paixão pelo ensino e interação com comunidade motivam jovens doutores da região do São Francisco

Com idades entre 28 e 32 anos, Danilo Cerqueira, Andrea Tavares e Felipe Thiago relatam suas trajetórias acadêmicas, evidenciando o quanto elas influenciaram no trabalho que hoje desenvolvem no Ifal.

publicado: 07/04/2017 16h33, última modificação: 10/04/2017 11h54
Exibir carrossel de imagens Em atuação no Campus Penedo há apenas dois meses, Andrea Tavares dá aulas de Química nas turmas dos cursos integrados.

Em atuação no Campus Penedo há apenas dois meses, Andrea Tavares dá aulas de Química nas turmas dos cursos integrados.

Numa instituição educacional cujo eixo é formado pelo tripé ensino-pesquisa-extensão, desenvolver pesquisas é a atividade que mais atrai os professores com título de doutorado, em função da familiaridade com a área adquirida ao longo de sua trajetória acadêmica, correto? Não no caso dos doutores mais jovens dos campi do Instituto Federal de Alagoas (Ifal), localizados na região do São Francisco. Tanto em Penedo quanto em Piranhas, os três professores entrevistados para a série “Jovens Doutores” se revelaram pesquisadores que encontram na prática docente e no contato direto com a comunidade suas principais motivações profissionais.

Com idades entre 28 e 32 anos, Danilo César Oliveira de Cerqueira, do Campus Piranhas, Andrea Macleybiane Gois Tavares e Felipe Thiago Caldeira de Souza, do Campus Penedo, relataram suas trajetórias acadêmicas, evidenciando o quanto elas influenciaram no trabalho que hoje desenvolvem no Ifal. Todos afirmaram se identificar com o ensino técnico de nível médio e com o interesse em desenvolver trabalhos que possibilitem a transformação da realidade local, isto é, das comunidades nas quais os dois campi estão inseridos.

De monitor na graduação à docente da rede profissional e tecnológica

Natural de Maceió, Danilo Cerqueira é o mais jovem desse grupo e, há pouco mais de quatro anos, integra o quadro docente do Ifal Piranhas, onde atua no curso técnico em Agroecologia. Segundo ele, quando ingressou no curso de Engenharia Agronômica da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), em 2005, não visualizava a carreira acadêmica como meta. “Ocorreu de forma natural. No percurso, é que fui identificando que gostava muito de ler, de pesquisar”, conta.

No entanto, durante a graduação, não era à iniciação científica que ele se dedicava. “Trabalhei como monitor de duas disciplinas [Fisiologia Vegetal e Física do Solo] nos quatro dos cinco anos do curso. A participação na área de pesquisa ocorria de forma voluntária, já que meus orientadores das disciplinas da monitoria também eram pesquisadores”, afirma o docente, acrescentando que, ao concluir a graduação, o caminho que se apresentava era o ingresso no mercado de trabalho, mas àquela altura Danilo já sentia que se identificava mais com a vida acadêmica.

“Eu tinha a opção de trabalhar como agrônomo nas diversas usinas canavieiras situadas em Alagoas, mas percebi que possuía mais habilidades para o ensino e pesquisa, do que na indústria. Foi, então, quando decidi fazer mestrado e, a partir daí, passei a considerar a carreira docente como objetivo profissional a ser alcançado”, lembra Danilo, que já naquela época definiu os institutos federais de educação, ciência e tecnologia como meta de ambiente de trabalho.

O concurso público para o Ifal foi realizado em 2010, quando ainda estava no mestrado, na Ufal. Obteve o título em 2011 e, no ano seguinte, quando estava no primeiro ano do doutorado, também na Federal de Alagoas, houve a convocação. Durante a pós-graduação, recebia bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes/MEC). “Somado a outras práticas, esse tipo de investimento é importante no sentido de permitir que o mestrando ou doutorando possa realmente se dedicar. Inclusive, sou grato ao Ifal pela concessão de meu afastamento no último ano do doutorado”, reconhece.

O retorno desse investimento Danilo pretende mostrar na sala de aula e nos ambientes de formação prática, fazendo uso das habilidades de pesquisador. “Desde que ingressei no instituto, tenho a pesquisa como estímulo para melhorar a qualidade do ensino e é com a formação de nível médio que gosto de trabalhar”, ressalta o docente, cuja atuação está ligada ao desenvolvimento de produtos alternativos ao uso de agrotóxicos. “Desde o mestrado, trabalho com extratos vegetais com potencial para o controle de pragas e doenças de plantas”. Segundo ele, somados a outros manejos na agroecologia, esses extratos podem substituir, por exemplo, pesticidas e herbicidas. Essas pesquisas da pós-graduação lhe renderam certificações de excelência acadêmica, concedidas pela Ufal a projetos que se destacam.

Na extensão, os projetos estão ligados à produção de mudas de hortaliças, com o envolvimento de pessoas de comunidades próximas, pequenos produtores e familiares de alunos e servidores para criação de hortas domésticas. “Está entre meus planos, aplicar os resultados da pesquisa para solucionar problemas na agricultura local, com ênfase na oferta de opções ao uso de agrotóxicos para os pequenos produtores da região”, afirma Danilo, acrescentando que o objetivo é fazer com que esse público se torne, cada vez mais, adepto da produção orgânica, impactando na qualidade do consumo de legumes, verduras, frutas e outros tipos de vegetais.

Paixão pelo ensino de nível médio

Professores do Campus Penedo, Andrea Tavares, 30 anos, e Felipe Thiago Souza, 32, também viveram uma história ininterrupta de estudos, da graduação ao doutorado, em uma mesma instituição de ensino superior. Com mais outros três professores, atualmente, eles compõem o pequeno grupo de doutores em atuação no campus, num universo de quase 50 docentes efetivos.

Andrea é sergipana e trabalha no Ifal há apenas dois meses como professora de Química em turmas dos cursos técnicos integrados ao subsequente ao ensino médio. Sua relação com a área começou em 2003, quando ingressou no curso técnico em Análises e Processos Químicos do antigo Cefet-SE, hoje Instituto Federal de Sergipe (IFS). Ingressou na licenciatura em Química da Universidade Federal de Sergipe (UFS), no ano seguinte, e cursou as duas formações de forma concomitante.

Na UFS, começou a atuar na iniciação científica já no terceiro período do curso, a convite de uma professora cuja média de Andrea na disciplina foi dez. “Ela me indicou para ser bolsista da pesquisa que o esposo dela estava desenvolvendo e eu acabei seguindo com ele até o meu mestrado estudando o mesmo tema”, relata a docente, referindo-se à pesquisa relacionada à síntese e caracterização de novas pastas de cimento aditivadas com resinas epóxi para aplicação em poços de petróleo. Segundo ela, tratava-se de pastas mais resistentes a ataques ácidos.

No entanto, o mestrado foi no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais, onde também fez o doutorado, mas com outra linha de pesquisa. "Passei a estudar ligas de titânio, nióbio e silício para aplicação em implante ortopédico femoral”. A pesquisa gerou dois artigos científicos publicados em periódicos e essas ligas ainda são objeto de pesquisa na UFS.

Surgiu a possibilidade de Andrea fazer um pós-doutorado em São Paulo, mas a vontade de atuar no magistério falou mais alto. “O convite para ir para Universidade de Campinas (Unicamp) surgiu no dia da minha defesa da tese, mas eu era professora da Secretaria de Educação do Estado de Sergipe desde 2013 e não quis largar o meu trabalho”, afirma, acrescentando que já tinha feito metade do doutorado conciliando-o com as atividades exercidas em uma escola no interior de Sergipe.

Foi nessa escola que Andrea se descobriu uma entusiasta da educação de nível médio. “Meu primeiro contato com o ensino foi como estagiária docente da UFS, na graduação Engenharia de Materiais, mas foi na sala de aula com adolescentes que me reconheci professora. Não tem nada melhor do que saber que você pode influenciar a vida de uma pessoa incentivando-a a seguir um futuro promissor. O ensino médio é uma fase da vida que mexe muito com isso”, justifica.

Com tão pouco tempo de atuação no Ifal, Andrea ainda não tem projetos formalizados, mas já vislumbra algumas possibilidades para além da dedicação na sala de aula. “Aproveitando a linha de pesquisa do meu mestrado, é possível trabalhar com algum compósito derivado do rejeito da cana-de-açúcar, por exemplo, mas ainda não direcionei nada porque estou em fase de adaptação”, afirma a jovem doutora apontando como um outro caminho um outro caminho o estudo dos processos corrosivos das tubulações das usinas na região, já que em seu doutorado trabalhou com metais. “Antes, é preciso checar a viabilidade dessas pesquisas, pois há alguns estudos que são mais simples, mas que requer equipamentos não disponíveis no campus. Então eu teria que buscar cooperação junto a outras instituições, ou seja, tentar viabilizar primeiro essas parcerias para desenvolver as pesquisas”, conclui.

Preocupação com a melhoria de vida da comunidade

O segundo doutor mais jovem do Ifal Penedo, Felipe Thiago Souza, é também um dos mais antigos do campus criado em 2010. Ingressou na instituição no segundo semestre de 2011, quando estava no primeiro ano do doutorado em Química e Biotecnologia, na Ufal. Assim como Danilo e Andrea, sua carreira acadêmica não foi algo planejado desde a graduação. “Meu contato com pesquisa aconteceu a partir do mestrado, porque na época do curso de Engenharia Química, o que eu mais fiz foi dar aula de matemática e física como monitor em escolas estaduais”, lembra.

Durante o doutorado, quando já estava no Ifal Penedo, não solicitou afastamento e conseguiu conciliar as duas atividades. “Foi uma fase bem complicada, porque eu vinha para o campus dar aula e precisava usar os laboratórios da Ufal em Maceió para a minha tese. Passei várias noites na universidade fazendo reações químicas para concluir os prazos”, relata o jovem doutor, referindo-se à pesquisa relacionada à síntese de nanotubos de carbono (fibra de enorme potencial econômico com aplicações em diversas áreas, entre elas, a biomedicina e engenharias).

Segundo Felipe Thiago, a pesquisa do doutorado rendeu, além da publicação de artigo em periódico, o pedido de patente da tecnologia usada no estudo, que está sendo retomado e terá continuidade com a participação de estudantes do Campus Penedo já selecionados por ele. “Submetemos o projeto à Fapeal e conseguimos aprová-lo com um financiamento de R$ 15 mil”, informa o docente, que contará com a colaboração de sua orientadora do doutorado, Rusiene Monteiro de Almeida, e do professor da Ufal de Arapiraca, Vander Monteiro.

Ainda na área de pesquisa, Felipe Thiago coordena dois projetos de iniciação científica, sendo um deles voltado à produção de materiais adsorventes a partir de resíduos agrícolas e agroindustriais para remoção de contaminantes dos efluentes da indústria sucroalcooleira, têxtil e de processamento da mandioca. O outro projeto está relacionado à área de turismo, um estudo que revela muito mais a preocupação do docente com a realidade local do que com a sua formação de engenheiro químico. “Escolhi Penedo para viver e quero colaborar com o desenvolvimento da cidade, interagindo diretamente com a comunidade”, ressalta.

A pesquisa em questão busca avaliar a percepção da sociedade e organizações em relação ao turismo do município. “A ideia é que, a partir daí, possa se criar mecanismos através de políticas públicas que contribuam para o desenvolvimento econômico, social e cultural da cidade de Penedo”, explica, acrescentando que o estudo conta com a colaboração de sua esposa, estudante de Turismo da Ufal, Luzia Dalila Rodrigues. “Essa pesquisa foi inclusive premiada no Caiite 2016 [Congresso Acadêmico Integrado de Inovação e Tecnologia], informa.

Na extensão, Felipe Thiago agrega seu conhecimento na área de ciências exatas à possibilidade de contribuir para a melhoria de vida das pessoas, uma preocupação social que, segundo ele, resulta do convívio com professores da área de humanidades do Campus Penedo. “É algo que também me acompanha desde minha época de monitor em escolas estaduais. Ensinei em turmas de educação de jovens e adultos [EJA], em comunidades muito carentes, e sei o quanto é importante trabalhar para oferecer oportunidade às pessoas”.

Entre os projetos de extensão já desenvolvidos está a aplicação das práticas de qualidade, segurança, meio ambiente e saúde nas casas de farinha da comunidade quilombola Tabuleiro dos Negros e o trabalho de reutilização de resíduos (bagaço da cana-de-açúcar) para alimentação de equinos no Centro de Reabilitação e Equoterapia Santa Clara (Acresc). Neste último projeto, como resultado, a clínica reduziu os custos para manutenção da dieta animal, conseguindo ampliar o número de vagas para atendimento de pessoas de baixa renda.

Atualmente, o projeto de extensão que coordena está voltado para a geração de renda e tem como público-alvo mulheres em condições de vulnerabilidade econômica e social. A proposta é ensiná-las a produzir licor caseiro, aproveitando a matéria-prima que se tem disponível, principalmente, frutas regionais. A ação integra o Programa Minha Comunidade e está sendo desenvolvida na comunidade quilombola Oiteiro.

Para um futuro próximo, Felipe Thiago planeja fazer pós-doutorado no exterior, mas ainda não definiu o destino. “A ideia é não parar e estar sempre produzindo”, afirma. Ele também destaca o apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação do Ifal (PRPI). “Apesar de o campus ainda não ter a estrutura de laboratórios que preciso, o investimento em bolsas é um importante incentivo”, destaca o docente ao se referir à bolsa produtividade que recebe e às bolsas concedidas aos estudantes.

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